É tarde de quinta feira, faz bastante calor lá fóra, o tempo está abafado, estou na 15a paciente da tarde e na 35a de todo o dia.
-Boa tarde Dona Maria Aparecida, tudo bem?
D. Maria olha para mim como se eu estivesse brincando com ela e com ironia responde:
-Se estivesse tudo bem eu não estaria aqui né doutor, estaria me abanando em casa com esse calor…
Eu, percebendo o mau humor, repenso a abordagem:
-Bom, então os exames estão prontos, e está tudo em ordem para senhora operar. Já passou com o anestesista, o convênio já autorizou e a Paula agendou para próxima quarta, tudo bem?
-Bem não tá né doutor, fazer o que?
Pensando que aquilo não deveria ser fácil resolvi já partir para o epílogo e:
-Bom não tem mais nenhuma dúvida quanto á cirurgia então?
E ela levantando apenas uma das sombrancelhas me olhou de lado e perguntou num tom ameaçador:
-Não tem risco né doutor?
Diante do óbvio beco sem saída que é tentar quantificar o risco que não é grande mas existe sem amedrontar uma senhora prestes a entregar sua valiosa consciência á um anestesista e seu corpo á esse médico á sua frente que deve ter 1/3 da sua idade respondo:
-Dona Maria, risco tem, mas estatisticamente é pequeno.
-Então não tem risco né?
-Olha minha querida, tudo na vida tem risco, atravessar a rua tem risco, mas poucos são atropelados, portanto…
-Tá portanto não tem risco?
-Tem risco, mas é tão pequeno que compensa pelo benefício que a cirurgia vai te trazer.
-Tudo bem, doutor, obrigado, fico aliviada de saber que então não tem risco, adeus…
-Ah!!
Balbucio, enquanto ouço a porta fechando á minha frente e Dona Maria Aparecida desaparecendo atrás dela, triunfal.
(Todos os contos de consultórios refletem o dia-a-dia da clínica de um ginecologista, mas são obras de ficção e não representam individualmente nenhuma situação real).
1 Comment
Helena
21 de janeiro de 2011
Ah Doutor!!!!Pelo menos ela foi achando que não tem risco…rsrsrs e que tudo vai dar certo, porque se depender do seu trabalho somente ela com certeza está garantida….
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